Em Março último, o C@2000 voltava a noticiar o não cumprimento por parte da Câmara de Caminha de uma sentença judicial, já confirmada pelo Supremo Tribunal. Em causa a contenda com o proprietário de um prédio no centro histórico, que a autarquia arrendara para instalar serviços e que pretendera entregar em 2005, mas sem repor as condições em que recebera o imóvel e violando o contrato. À parte o prejuízo galopante para os cofres do município, a aparente teimosia de Júlia Paula pode valer-lhe, em última análise, perlo menos, uma pena de prisão, porque a lei considera crime o "Desacatamento ou recusa de execução de decisão de tribunal": está tudo no Artigo 13.º da Lei 34/87, de 16/7, que define os crimes da responsabilidade que titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos cometam no exercício das suas funções.
A legislação é clara e pode ser consultada no portal do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), na área correspondente a "Legislação e normas regulamentares, em http://www.pgr.pt/grupo_pgr/Dciap/legislacao.html
A Lei 34/87, de 16/7 - Crimes da responsabilidade que titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos cometam no exercício das suas funções, no seu CAPÍTULO I, começa por falar dos crimes de responsabilidade de titular de cargo político em geral e o Artigo 1.º define o "Âmbito da presente lei": "A presente lei determina os crimes da responsabilidade que titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos cometam no exercício das suas funções, bem como as sanções que lhes são aplicáveis e os respectivos efeitos."
No Artigo 2.º, a definição genérica deixa claro que "Consideram-se praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções, além dos como tais previstos na presente lei, os previstos na lei penal geral com referência expressa a esse exercício ou os que mostrem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres."
Finalmente, no Artigo 3.º diz-se quais são os cargos políticos considerados para os efeitos da presente lei e, na alínea "i" fala-se do membro de órgão representativo de autarquia local, sendo que o primeiro responsável é o presidente da câmara.
No CAPÍTULO II esmiúçam-se os crimes de responsabilidade de titular de cargo político em especial e é no Artigo 13.º que encontramos o enquadramento para o caso do prédio das imediações da Biblioteca, propriedade do advogado Dionísio Marques.
Segundo o C@2000 apurou junto de um jurista, sendo a última decisão (Supremo Tribunal de Justiça) já do ano passado, do mês de Novembro, nesta altura passaram mais de seis meses e a sentença já terá transitado em julgado, pelo que existe crime de "Desacatamento ou recusa de execução de decisão de tribunal". Segundo o Artigo 13.º, "O titular de cargo político que no exercício das suas funções recusar acatamento ou execução que, por dever do cargo, lhe cumpram a decisão de tribunal transitada em julgado será punido com prisão até um ano".
Prejuízos galopantes a cada mês que passa
Recorde-se que a Câmara pretendeu entregar em o prédio em 2005, mas sem repor as condições em que recebera o imóvel. A violação do contrato era clara e o proprietário não aceitou, recorrendo a tribunal. Como é norma da Câmara, neste como outros casos, o processo arrastou-se até ao Supremo Tribunal, que confirmou a condenação do município. Assim sendo, desde Setembro de 2005 até à data em que a sentença for cumprida, a Câmara será obrigada a pagar uma renda mensal de quase de três mil euros ao proprietário, verba acrescida de juros.
De acordo com o mesmo jurista, o prejuízo que está a ser provocado aos cofres da Câmara Municipal poderá dar origem a outro processo e os responsáveis políticos condenados e obrigados a ressarcir o erário público.
Na verdade, não se sabe qual o montante total já em dívida, mas só em rendas, desde Setembro de 2005 até à sentença do STJ, tinham-se acumulado até Março último qualquer coisa como um quarto de milhão de euros. Recorde-se que a conta não se fica pelas rendas. O STJ entendeu que a Câmara deveria pagar ao Autor (proprietário), a título de indemnização, a quantia mensal de € 2.936,04 desde Setembro de 2005, até ao momento em que a ordenada restituição se mostre feita… e juros de mora, à taxa de 4 por cento ou outra que venha a ser estabelecida por lei, sobre tal quantia mensal, bem como a pagar juros compulsórios, à taxa de 5 por cento a partir do trânsito em julgado do respectivo acórdão, sobre as quantias indemnizatórias que estiverem em dívida.
Aos juros de mora e compulsórios acresciam na altura as custas nas diversas instâncias e, no caso da Câmara, os honorários dos advogados.
Caso pode ser despoletado a qualquer momento
Aparentemente, tudo continua fechado e a degradar-se prédio localizado entre a Rua Direita e a Rua do Hospital (antigo restaurante Caminhense). Não há sinais ou notícias de que a Câmara e a sua ainda presidente, Júlia Paula, queiram cumprir a sentença do tribunal. Assim sendo, poderá ser o proprietário, Dionísio Marques, a despoletar o caso junto da Justiça.
Porém, tratando-se de um crime coma s características descritas, alegadamente cometido por um político e que lesa profundamente o erário público, qualquer pessoa pode proceder à denúncia, junto do próprio DCIAP por exemplo, até por via eletrónica.
Sabe-se que entre as alterações realizadas no edifício está a retirada das cozinhas, que foram na altura armazenadas no Pavilhão Municipal, ainda no tempo de Valdemar Patrício. Só que já passaram muitos anos e nem se sabe se ainda existem e se estão em condições de ser reinstaladas, ou se a degradação tomou conta delas, sendo esta a hipótese mais provável.
Certo é que a conta a pagar pela Câmara sobe a cada dia que passa formando uma espiral de prejuízos por enquanto imparável. Passaram entretanto quase oito anos depois do início do litígio.
O C@2000 continua a desconhecer as intenções da Câmara, uma vez que, por força do blackout imposto ao nosso jornal, não nos é possível ouvir a posição do Executivo social-democrata.