Jornal Digital Regional
Nº 573: 4/10 Fev 12
(Semanal - Sábados)






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TRIBUNA
Espaço reservado à opinião do leitor



MODOS, USOS E COSTUMES
NA VEIGA LITORAL VIANENSE

"O litoral minhoto, colonizado á custa do sargaço extraído das águas, dá uma imagem da vida rural, profundamente penetrada pelo oceano"
Orlando Ribeiro, Geografia de Portugal

Tendo por base um contexto específico dentro do Noroeste Português, a faixa litoral do concelho de Viana do Castelo, pretende-se analisar as características que individualizam este território e lhe formam um carácter, resultante de uma construção humana em constante mutação .

Este é um percurso em que o ser humano, pela interacção com o meio natural, criou sistemas históricamente datados e capazes de se adaptarem à evolução das condições.

Assim, analisaram-se fragmentos de ruralidades, aparentemente anacrónicas e a sua expressão de paisagem MODOS, frágeis teias socioculturais, plenas de significados no âmbito de uma antropologia de urgência.

A faixa litoral do concelho de Viana do Castelo, compreendida entre o Rio Neiva e a Gelfa, numa extensão de 24 kms., abrange as freguesias de Castelo de Neiva, Chafé, Vila Nova de Anha, na margem sul e Areosa, Carreço, Afife, na margem norte. Todas estas freguesias têm em comum a veiga, numa faixa plana e de grande fertilidade.

Darque e Monserrate não se viraram para a veiga, relacionando-se mais com o rio e com o mar, através dos pescadores da Ribeira.

Apesar de ter características próprias, esta faixa está geograficamente situada no Norte Atlântico, que se caracteriza por um clima pluvioso e um relevo acidentado, com a quase totalidade do território acima dos 400 metros.

Estas condições vão definir as formas de ocupação do solo, do ponto de vista da sua utilização, da história, cultura e tradições a ele associados. Os elevados níveis de precipitação, possibilitaram uma policultura intensiva, em sistema de campo-prado, criando condições para a fixação da população, tornando-se esta região a de maior densidade populacional do País.

Os campos, geralmente delimitados por muros, são de pequenas dimensões( por causa do constante processo de divisão, provocado pela transmissão hereditária ), desenhando uma paisagem que se assemelha a uma manta de retalhos, todos verdes, mas de diferentes tonalidades, causadas mais, pelos diferentes graus de maturação da cultura do que pela diversidade do produto cultivado.

De facto, o milho-maiz, introduzido em Portugal no Século XVI, encontrou nesta região, condições ideais, nomeadamente, de rega, tornando-se base da alimentação, sendo até hà poucos anos usado o termo Pão, para o pão de milho (broa), ficando o termo Trigo, a ser usado para o pão de padaria, feito deste cereal.

Ao lado do milho encontramos outros cereais, principalmente o centeio e o trigo ed outras culturas associadas, como o feijão, a abóbora, a batata e mais produtos hortícolas, além de árvores de fruta e vinha. O centeio é adicionado á massa do pão, tornando-o mais consistente e a sua palha tem diversas utilizações domésticas, desde queimar o porco durante a matança a encher colchões. Já o trigo, cereal, considerado mais limpo e rico, é cultivado, a maior parte das vezes, para pagar o arrendamento das terras, cujo valor era estabelecido em medidas de volume deste cereal, que raramente entrava na alimentação popular.

A presença do gado era essencial em todo este processo e, por isso, era praticado o sistema campo-prado, em que às culturas de verão se sucedem os prados no inverno.

O gado era utilizado como meio de transporte, puxando os carros, como animal de tiro para as alfaias agrícolas, como produtor de estrume, fazendo assim a ligação do campo e do monte, onde se ia buscar o mato que se espalhava no chão das cortes para as camas dos animais, sendo depois retirado para adubar os campos.

O gado marca assim a sua presença em todo o ciclo agrícola, podendo ainda fornecer proteínas animais à alimentação, pelo leite e carne.

A vinha surge como outro elemento quase omnipresente nesta região. Tradicionalmente encostada aos muros que delimitam as propriedades, expandindo-se em sistema de latada, por cima dos campos de cultivo, não os ocupa e permite a utilização do solo.

Só recentemente, em meados do século XX, o cultivo da vinha tomou conta de campos integralmente , abandonando a latada e desenvolvendo outros sistemas de condução, como a cruzeta. ( A seguir, MODOS agrícolas seculares)

Antero Sampaio