Prestes a completar 66 anos de idade, faleceu na sua residência em Viana do Castelo no passado domingo, 29 de Janeiro, o professor e intelectual Fernando Canedo. De seu nome completo Fernando Manuel Reis Canedo Ribeiro, nasceu em Vila Nova de Gaia em 14 de Fevereiro de 1946, era licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e de 1988/89 até à sua recente aposentação leccionou a disciplina de Filosofia na Escola Secundária de Monserrate. Para além da função docente, Fernando Canedo foi dirigente sindical no SPN, activista político — sempre à esquerda, militou primeiro na UDP e mais tarde, já aderente do PCP, foi deputado na Assembleia Municipal de Viana do Castelo de 1982 a 1985 em representação da CDU — e um destacado homem de cultura, nomeadamente na direção do Centro Cultural do Alto Minho e na coordenação da revista Mea Libra.
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No início da sua carreira profissional, há pouco regressado da Guerra Colonial — cumpriu serviço militar na Guiné, aí consolidando a sua opção política de oposição ao regime ditatorial — foi professor na Escola Preparatória de Caminha nos anos lectivos de 1973/74 e 1974/75. Após o 25 de Abril de 1974, assumiu-se em Caminha como um dos principais activistas do Movimento de Unidade Popular (MUP), plataforma informal da esquerda caminhense nos anos de 1974 e 1975, desempenhando um papel de ideólogo e protagonizando algumas das mais significativas acções deste movimento local. Nas páginas do jornal O Caminhense, foram da sua autoria os primeiros artigos de divulgação marxista — subordinados ao título "O comunismo não é um papão" — e outros de incentivo ao cooperativismo que chegaram a originar um processo de associativismo agrícola na freguesia de Vilar de Mouros. Num tempo em que a participação popular explodia em festa e alegria após décadas de silêncio, Fernando Canedo foi orador em muitos dos primeiros comícios, reuniões e cantos livres realizados no concelho, desde o Terreiro de Caminha e da Praça da República de Vila Praia de Âncora até às freguesias rurais da Serra de Arga. No dia 12 de Março de 1975, no rescaldo da tentativa fracassada de golpe de estado spinolista, foi ele que da varanda dos Paços do Concelho dirigiu primeiro a palavra aos caminhenses ali reunidos.

Amigo dos seus amigos, independentemente das suas opções partidárias, Fernando Canedo desempenhou entretanto na Escola Preparatória de Caminha um papel moderador, liderando as manifestações de docentes, funcionários e alunos em repúdio pela exoneração, por força de lei, da então Diretora Carolina Santiago. Deixou a escola e o concelho em finais de 1975, pouco depois do 25 de Novembro, dia que marcou o fim do PREC português e que recordou em entrevista que nos concedeu em 2004 quando, por ocasião dos 30 anos do 25 de Abril, regressou por momentos a Caminha: "Ainda estava cá colocado no dia 25 de Novembro, nesse ano as colocações de professores foram muito tarde e, no dia 26 de Novembro, vim a Caminha para a escola. Recordo-me que havia um enorme silêncio, a vila de Caminha estava deserta, não se via vivalma da parte da manhã … Eu fui à escola mas como me disseram que não havia aulas, eu vim para o Terreiro e não encontrei mais ninguém a não ser o Sr. Diogo de Oliveira, que fazia então parte do executivo da Comissão Administrativa e que me disse que os funcionários da Câmara o teriam encarado com alguma hostilidade… Lembro-me que só nos encontrávamos nós no Terreiro e eu disse que tínhamos de ficar ali para mostrar que não tínhamos medo, e lá ficámos os dois no meio da praça toda a manhã a conversar um com o outro. Este é o episódio final e depois eu sou colocado em Viana do Castelo e afasto-me da vida política caminhense". Não completamente, já que por altura das eleições para a Assembleia da República em 1976, quando foi cabeça de lista da União Democrática Popular por Viana do Castelo, ainda regressou a Caminha para, com alguns dos antigos activistas do MUP, formar o núcleo concelhio da UDP.
No final da entrevista citada, questionado sobre se o 25 de Abril de 1974 tinha valido a pena, Fernando Canedo não hesitou quando nos respondeu: "Se valeu! Valeu com certeza. Portugal é hoje um país completamente diferente, há liberdade, apesar de tudo as oportunidades são maiores, há outra vivência neste país que era um país amordaçado e, hoje, apesar das dificuldades, não o é. Portanto, valeu a pena o 25 de Abril, sem dúvida". Do mesmo modo, apesar do seu falecimento inesperado e prematuro, também valeu a vida de Fernando Canedo, de quem os seus amigos recordarão sempre a inteligência, formação cultural e, mais do que tudo, o trato afável de um homem solidário e de causas.