Conhece-se, desde há séculos, a história da mulher, no que respeita ao sofrimento de que tem sido vitimai, devido às desigualdades entre ela e o homem. Por razões culturais, religiosas, políticas, laborais e outras, o certo é que não se tem reconhecido o mérito e as capacidades que possui. A sociedade masculinizada que a tem rodeado cortara-lhe as possibilidades de desenvolvimento e até de participação activa nas diversas actividades que poderiam ser comuns aos dois géneros.
O homem reservou-lhe, ao longo da sua história, as tarefas que considerava próprias da mulher: procriar, educar os filhos, cuidar da casa e até da lavoura. Mas os tempos, as mentalidades, os valores, as capacidades e as leis têm vindo a mudar e a reconhecer à mulher os seus verdadeiros e inalienáveis direitos, como também os seus deveres. Ainda bem.
A predominância do género masculino, ao longo dos tempos, constitui, por isso, uma inaceitável injustiça, não havendo quaisquer morais, éticas, científicas ou outras para que assim tenha acontecido, pelo contrário, o conhecimento que hoje se tem aponta para uma mulher decidida, competente, destemida, como também carinhosa, que ama e que sofre, tolerante e comprometida com a família, enfim, uma mulher responsável, em todas as actividades em que se envolve.
O direito à igualdade impunha-se deste há séculos e, mais tarde ou mais cedo, a emancipação da mulher seria um facto. Naturalmente que os regimes democráticos estão mais abertos a esta problemática, contudo, a aceitação da igualdade de direitos e de oportunidades vai-se protelando no tempo e só aos poucos é que as mulheres conseguem adquirir os mesmos direitos dos homens.
É possível que para certas actividades, públicas e privadas, se levantem restrições na admissão de mulheres a ocuparem determinados cargos. O homem tem medo de perder o seu poder, aliás, conquistado, por vezes, através de processos coercivos. A sociedade comporta os dois géneros, porém, por vezes ignora-os a favor do homem e, segundo afirma SILVA, (1990:29): "É frequente dizer-se que uma vez estabelecidas as leis igualitárias, tudo é uma questão de educação e de cultura, de mudança e de mentalidades, atitudes, hábitos e tradições, uma mera questão de evolução natural da sociedade civil, cujo ritmo de mudança há que respeitar. (…) Porque além de ser uma questão cultural é também uma questão política, que envolve e responsabiliza o próprio Estado, que tem, não só que considerar como tal, na sua filosofia governativa, mas que tem também que criar as condições necessárias e suficientes, para que a igualdade exista em todas as áreas, como questão global, multidisciplinar e transversal que é."
Assiste-se, actualmente, nos casais mais jovens, de um modo mais aberto e já em alguns mais idosos, mesmo com alguma reserva, a uma melhor harmonia na partilha de certas tarefas domésticas, com grande entusiasmo e alegria. É bom constatar-se esta mudança da qual se tem conhecimento, por exemplo, através do desenvolvimento de reflexões autobiográficas que os adultos apresentam nos processos de Reconhecimento e Validação de Competências-Chave a decorrer nos Centros de Novas Oportunidades, para os níveis básico e secundário. Parece ser uma boa estatística os dados recolhidos por esta via, significando, portanto, que uma nova realidade na igualdade de género está a crescer.
Outros casais, por exemplo, optam ou têm a possibilidade de os dois cônjuges trabalharem, mas um deles tem mais trabalho fora de casa e o outro apenas dispõe de um horário normal. Neste caso o que chega mais cedo a casa adianta os trabalhos domésticos que poderiam ser repartidos pelos dois. Trata-se, uma vez mais, de colocar uma estratégia ao serviço da igualdade de género em que o resultado final é bom para os dois e para os filhos. Hoje não existem razões aparentes para que a desigualdade de género prossiga como se verificava há algumas dezenas de anos.
Ao reflectir, desde logo sobre a igualdade de género, no matrimónio, qualquer que seja a sua constituição, obviamente que se pretende, a partir da família, cultivar essa mentalidade de partilha, de lealdade, de entre-ajuda, independentemente do género. A igualdade desenvolvida ao longo de uma vida a dois, passar-se-á para os filhos e destes para os netos. Na vida a dois esposa e marido, depois a três, a quatro e os que forem nascendo - os filhos -, a ideia de partilha deve evoluir e cimentar-se, aliás, na perspectiva de GUERRERO, (1971:189): "Os esposos devem com toda a simplicidade e franqueza examinar conjuntamente as suas dificuldades. Sem isso, a sua animosidade, ao acumular-se, corre de evolucionar para um rancor e desejo de vingança. Num momento crítico bastará uma coisinha de nada para a cólera se acender e para se soltar palavras duras e malévolas, prejudiciais à unidade do lar."
Verificada que esteja a igualdade de género no seio da família, o caminho para o reconhecimento dos direitos da mulher, acompanhados de idênticos deveres, parece ficar mais facilitado, para ambos os géneros. Com efeito a sociedade é um pouco o retrato das famílias. As desigualdades de género, por vezes, também podem resultar da estratificação social estabelecida numa determinada sociedade, na qual as mulheres desempenham papeis diferentes dos homens e, eventualmente, de menor relevância. Afirma GOLDTHORPE, (1997: 85) que: "Em todas as sociedades existem instituições que explicam a diferença entre homens e mulheres, na medida em que regulam condições em que se acasalam e se reproduzem, a escolha de parceiro conjugal e a divisão de trabalho entre eles."
Partindo-se, portanto, de hábitos familiares, que para o efeito devem ser criados no sentido do reconhecimento mútuo da igualdade dos cônjuges, com o exercício das tarefas, previamente distribuídas, é possível construir-se uma sociedade que reconheça, inequivocamente, a igualdade de género, na maioria das situações que se deparam à mulher e ao homem. Os jovens ao serem lançados para o mundo exterior, ao da casa de família, transportam consigo as práticas que ao longo de muitos anos observaram em casa, e isso já significa uma grande experiência para eles se constituírem numa nova família, ainda mais igual entre os cônjuges do que a que eventualmente, assistiram entre os seus pais.
Pensa-se, apesar de toda uma movimentação a favor da igualdade de género, provavelmente em todo o mundo, que tal igualdade, em todas as dimensões humanas, actividades e aspirações, ela jamais atingirá o pleno, até porque às mulheres estarão reservadas as mais nobres missões: uma das quais a de gerar dentro do seu próprio corpo os filhos, como aos homens o de participarem na génese e criação de uma nova vida e, mais tarde, no acompanhamento desse novo ser que será seu filho.
Claro que a igualdade aqui não é possível, é equivalente se assim se pode considerar. É inevitável não se aceitar, ainda hoje, final da primeira década do Século XXI, que a educação funciona, segundo o sexo e, portanto, não poderá haver total igualdade de género.
Afigura-se que em relação às raparigas, e no que toca à sua educação, haverá alguns cuidados diferentes e, por conseguinte, talvez algumas desigualdades comecem aqui. ANGERS, (2003: 85-86) refere que: "As meninas são, desde muito novas, rodeadas de uma atenção particular no que diz respeito ao vestuário, cabelo e aparência. Pensemos nos cuidados que a mãe prodigaliza à filha, nos elogios do pai à beleza da sua princesinha. (…) Destaca-se, assim, um traço fundamental na educação recebida pelas raparigas - ter orgulho no modo como se apresentam."
Por razões diferentes, quem sabe se biofísicas, os rapazes suscitam aos seus progenitores outro tipo de preocupações, no que se refere à educação. Ainda na óptica de ANGERS, (2003: 90) afirma o autor que: "Observações efectuadas junto de rapazes revelam que eles aprenderam a ter orgulho na sua imoderação. Segundo os sociólogos Baudelot e Establet 'as críticas cheias de orgulho feitas aos rapazes que chegam a casa sujos e desalinhados' têm importantes repercussões no carácter dos rapazes. Não passa pela cabeça dos pais serem tão severos com um filho que chega a casa todo esfarrapado como com uma filha que se apresenta no mesmo estado. Também a agressividade e a rudeza são permitidas nos rapazes mas muito mal vistas nas raparigas."
A igualdade de género, globalmente considerada, será um conceito que, provavelmente e por enquanto, não passará disso mesmo. Muitas e benéficas são as diferenças que separam uma mulher de um homem, logo, outras tantas serão as diferenças. Apesar disso, existem outro tipo de igualdades de género que, essas sim, é preciso cultivar, aprofundar e introduzir na socialização da pessoa humana. Na igualdade de género e que se considera muito importante, parece residir a igualdade de oportunidades.
Neste domínio parece não haver dúvidas nenhumas quanto à justiça que se deve fazer à mulher, à recuperação dos valores que lhe estão subjacentes enquanto trabalhadora, qualquer que seja a actividade, até porque, por exemplo, não haverá nenhuma prova científica que aponte para a inferioridade da mulher em contexto de trabalho, na medida em que, segundo ROMÃO, (2000:15): "A qualidade é essencialmente definida pelas empresas nos seguintes termos: flexibilidade, capacidade de fornecer serviços e produtos de qualidade; capacidade de responder com rapidez às mudanças necessárias e capacidade de ser mais competitiva. (…) A pessoa torna-se a figura chave do processo de trabalho. Isto implica que (…) se esforcem as equipas de gestão, garantindo o contributo de Homens e Mulheres apostando na riqueza que uma vasta gama de qualidades e experiências, que se complementam umas às outras, podem trazer em benefício da empresa."
Se a igualdade de género depender da realização da igualdade de oportunidades, poder-se-á afirmar que o caminho, para lá se chegar está a ser percorrido, possivelmente com algum sucesso que, de resto, é reconhecido e merecido pela sociedade, relativamente às mulheres.
Se a igualdade de género se destina à indiferenciação total entre uma mulher e um homem, parece não ser possível e nem sequer será desejável por qualquer um dos géneros. Se por igualdade de género se pretende a abolição de todo e qualquer tipo de violência contra as mulheres, então, também aqui, o caminho estará a ser percorrido, lentamente e com menos êxito.
As desigualdades de género serão vencidas, a médio e longo prazos, pela intervenção da família, da escola, da Igreja e pelas comunidades locais e nacionais, com o apoio poderoso de órgãos de comunicação social, forças políticas e seus instrumentos de poder.
Este será um desígnio nacional e mundial que estará para além e acima de outros valores materiais que tanto se apregoam. Depois de tudo o que aqui fica reflectido, uma preocupação poderá persistir: não queiram as mulheres perder o que de mais belo possuem: a feminilidade que conduz à sublime missão da maternidade, pelo amor, pela tolerância, pela cumplicidade, em troca de uma qualquer igualdade que, eventualmente, esteja na moda.
Bibliografia
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GOLDTHORPE, J. E. (1997). Sociologia e Antropologia Social: Introdução. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar Editoras
GUERRERO, José Maria, (1971). O Matrimónio Hoje, à Luz do Vaticano II, Trad. José Luís Mesquita. Braga: Editorial Franciscana
SILVA, Regina Tavares de, (1990). Direito à Igualdade. I Encontro de Mulheres Juristas dos Países Lusófonos, 12, 13, 14 de Outubro de 1990. Lisboa: Centro de Estudos Judiciários.
BÁRTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2008). "Cidadania dos Direitos das Mulheres no Espaço Autárquico", site www.caminha2000.com in "Jornal Digital "Caminha2000 - link Tribuna", N. 389 Semana de 10/16 Mai. 2008.
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Venade - Caminha - Portugal, 2009
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
bartolo.profuniv@mail.pt
4910-354 Venade - Caminha - Portugal
Mestre em Filosofia Moderna e Contemporânea
Universidades: Minho/Portugal; Unicamp/Brasil
Professor-Formador
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