A Semana Santa é, por definição, a mais significativa de todo o Ano Cristão. Comemorando a Entrada de Jesus em Jerusalém, a Igreja comemora em Domingo de Ramos a natureza profundamente surpreendente do triunfo que foi e é o de Cristo, triunfo que se dá naquela Jerusalém que "hoje" O acolhe em festa para depois se transformar no palco sumamente real de um drama sem igual, aquele que nos passará diante dos olhos durante o todo o Tríduo Pascal, sobretudo em Sexta-feira Santa, quando voltarmos a escutar silenciosos a narrativa da Paixão e fizermos a Adoração da Cruz, vendo nela, talvez, aquele que é o mais inóspito lugar da terra, pois feita patíbulo do mais inocente de todos os homens. 
Na Liturgia do Domingo de Ramos, porta de entrada em toda a vivência da Semana Santa, sobretudo com a narração que nela temos dos Passos de Jesus a caminho da Cruz, somos chamados a ver, ou nos é dado ver mesmo que não o queiramos, como são os mecanismos que "controlam", ou ditam, a nossa vida em comum, uma em que o "processo", não raro, e tal como no-lo revelam os próprios passos do Messias, começa, num primeiro momento, com toadas e hossanas, quando tudo parece ser apenas exaltação e glória; mas depois, logo depois, vem a histeria irracional dos gritos, vem a violência sem razão, vem o abuso da Lei, vem a mais infame condenação, uma que se dá não só num tribunal, mesmo iníquo, mas também aos gritos desalmados, irresponsáveis e odiosos, de coros que apenas falam para dizer a infâmia de uma liberdade que nem sequer o chega a ser: Crucifica-o!, gritam os populares em resposta à pergunta do soberano. E o grito, como bem o podemos e devemos ouvir, não foi apenas um: ele, de facto, foi insistente, foi forte, foi capaz de vergar aquela margem de inclinação para o Bem e a Verdade que até mesmo num homem como Pilatos se pode presumir. Os "Passos" de Jesus, por isso, são assim: em tudo igual aos nossos, exceto no facto de que os seus passos e caminhos, os seus desejos e a sua vontade não têm nada que se afeiçoe, ou avizinhe, do pecado; de facto, no Filho de Deus, Filho do Homem, tudo é graça, tudo é serenidade, tudo é paz. Sim, tudo é paz, mesmo quando sobe ao Templo e expulsa os vendilhões; tudo é paz e serenidade, mesmo quando mostra que o seu modo de ser não é o de quem se verga ao poder que o esmaga, mas apenas o de quem ao poder que esmaga apenas opõe um poder muito maior, tão grande que ele, esse tal poder, que é o do Amor, não pode ser já só, ou apenas, deste mundo. 
O Domingo de Ramos, portanto, constitui um grande e solene introito ao todo que é a Paixão de Cristo, ao drama tecido com os Atos de Amor d'Aquele que nos salva. Para todos os efeitos, neste primeiro dia da Semana Santa, a Liturgia ilustra-nos a razão de ser do nosso estar com Jesus: compreender que sem Ele não podemos fazer nada; compreender que sem Ele não podemos estar com Ele; compreender que se não estivermos com Ele estaremos apenas, na realidade, fora de nós. Eis, então, um convite que julgo nos deveria merecer atenção: escutar a narrativa da Paixão como quem escuta um relato que nos é familiar e contudo sempre novo; um relato que nos fala de tudo o que fez e foi Jesus, e contudo de uma só coisa nos dá sinal: do Amor que unificou, como nenhuma outra, toda a sua existência, pois em tudo e por tudo Jesus fez o único que Deus sabe e pode: Amar; amar sem limite e sem condições; amar até ao fim, mesmo quando este será o fim de quem morre, de todo abandonado à ignomínia da Cruz! Uma ignomínia, porém, que se transformará na razão de ser da nossa mais dileta e profunda alegria.