Jornal Digital Regional
Nº 603: 29 Set a 5 Out 12
(Semanal - Sábados)






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CIDADANIA

A Revolução Francesa de 1789 deverá, sem quaisquer complexos para os restantes povos, constituir uma bússola, um farol, uma referência, quando e sempre que se pretender invocar a História dos Direitos Humanos, independentemente das eventuais e compreensíveis insinuações que se possam proferir quanto à natureza ocidentalizada dos valores e princípios, consagrados na respectiva Declaração aprovada pela Assembleia-geral das Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948. O Preâmbulo da aludida Declaração, de 26 de Agosto de 1789 é, por si só, um marco fundamental do pensamento da comunidade francesa da época:

"Os representantes do povo francês, constituídos em Assembleia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo pelos direitos do homem são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos governos, resolvem expor, numa declaração solene, os direitos naturais inalienáveis e sagrados do homem, (...) para que os actos do poder legislativo e do poder executivo (...) sejam mais respeitados; para que as reclamações dos cidadãos, baseadas a partir de agora em princípios simples e incontestáveis visem sempre a defesa da constituição e a felicidade de todos." (in HAARSCHER, 1993:167) e (http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/dec1789.htm,17.07.2010)

Desde logo se destaca uma referência aos direitos naturais do homem que se enfatizam ao longo dos poucos, mas muito densos e significantes artigos da Declaração e a necessidade imperiosa de divulgar, promover e defender todo um conjunto de direitos e liberdades que hoje continuam a ser considerados valores supremos e absolutos, que não deveriam ser violados em circunstância alguma.

Por razões de ordem didáctica, seja permitido destacar alguns direitos consignados noutros tantos artigos da Declaração: "art. 1º - Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem ser fundamentadas na utilidade comum. Art. 4º - A liberdade consiste em poder fazer tudo o que não seja prejudicial a outrem: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem só tem por limites os que garantam aos outros membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esses limites só podem ser determinados por lei." (Ibid: 168)

Obviamente que ao analisar-se os documentos específicos: "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão" (França, 1789) e "Declaração Universal dos Direitos Humanos" (ONU, 1948) encontram-se flagrantes diferenças, na medida em que: enquanto na primeira apenas se defendem valores que integram direitos naturais, imprescritíveis, ou seja, direitos da primeira geração; na segunda, aprovada, decorridos que foram mais de cento e cinquenta anos, já se regista uma evolução, para melhor, onde se incorporam novos valores e os correlativos direitos, nomeadamente económicos, sociais e culturais, entre outros, os quais, numa taxinomia clássica, são designados por direitos de segunda e terceira gerações.

Ainda bem que assim aconteceu, todavia, nem tudo está no bom caminho, há que reconhecê-lo. A evolução que se regista na Declaração Universal dos Direitos Humanos e que interessa ao presente trabalho, relaciona-se, nesta perspectiva, com a educação e de facto, encontra-se esta preocupação no:

"Artº 26º - 1.) Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos no que respeita ao ensino elementar e fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve ser aberto em plena igualdade a todos em função do seu mérito. 2.) A educação deve visar o pleno desenvolvimento da personalidade humana e o reforço do respeito pelos direitos do homem e liberdades fundamentais. Deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, assim como o desenvolvimento das actividades das Nações Unidas pela manutenção da paz." (in Ibid., 174)

Entretanto, brasileiros e portugueses têm motivos para estarem razoavelmente satisfeitos, na medida em que no período compreendido entre a publicação dos dois importantes documentos anteriormente citados, e nos sistemas educativos, detectam-se, no âmbito do "ensino" da Filosofia e das Ciências da Educação, preocupações idênticas sobre a problemática dos direitos humanos naturais, verificando-se, inequivocamente, que apesar da posição dominante em relação às suas restantes ex-colónias, Portugal vinha acolhendo no seu sistema educativo os grandes princípios e valores pelos quais se deve reger uma sociedade organizada.

Naturalmente que no período colonial se cometeram muitos erros em matéria de direitos humanos; é conhecida a situação que atravessou parte da idade medieval por motivos religiosos; não se esconde a escravatura nem outras violações durante certos períodos da história colectiva, como também é justo afirmar que existem sérios esforços no sentido de melhorar os comportamentos face à necessidade imperativa de salvaguarda dos direitos humanos

A cidadania também implica assumir responsabilidades, quer do presente, quer do passado e os erros cometidos, ainda que no contexto de uma determinada mentalidade colonial, devem ser assumidos pedagogicamente.

A assertiva contrária, parece igualmente correcta: os naturais das então colónias, hoje países independentes, também compreenderão as dificuldades do povo em geral, que na sua esmagadora maioria também foi vítima de sistemas políticos ditatoriais.

Bibliografia
BÁRTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2002). "Silvestre Pinheiro Ferreira: Paladino dos Direitos Humanos no Espaço Luso-Brasileiro" Dissertação de Mestrado, Braga: Universidade do Minho, Lisboa: Biblioteca Nacional, CDU: 1Ferreira, Silvestre Pinheiro (043), 342.7 (043
BARTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2009). Filosofia Social e Política, Especialização: Cidadania Luso-Brasileira, Direitos Humanos e Relações Interpessoais, Tese de Doutoramento, Bahia/Brasil: FATECTA - Faculdade Teológica e Cultural da Bahia:
DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO. (1789). (Votada definitivamente em 2 de Outubro de 1789) (http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/dec1789.htm em 17.07.2010
HAARSCHER, Guy, (1993). A Filosofia dos Direitos do Homem. Trad. Armando F. Silva. Lisboa: Instituto Piaget.
ONU-ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (1948) Declaração Universal dos Direitos do Homem, Lisboa: Amnistia Internacional, Secção Portuguesa, 1998;