Poderia ser um lugar-comum afirmar-se que as promessas eleitorais fazem parte do jogo democrático, no sentido em que, há quem o afirme, podem não ser promessas, mas objetivos que, enquanto tais, são para serem atingidos e, se possível, ultrapassados, pela positiva, naturalmente. Ora, se as promessas são para se cumprirem, os objetivos destinam-se a obter os resultados que deles se esperam, que foram, inclusivamente, quantificados.
Promessas que não se cumprem, e/ou objetivos que não se alcançam, resultam em situações idênticas, ou seja, poderão ser interpretados como um não cumprimento do que estava prometido, planeado, divulgado e interiorizado, por todas as pessoas de boa-fé, respetivamente, que, legitimamente, até poderiam ter criado fortes expectativas para o futuro. O eleitorado, seja da área política ou de uma outra qualquer instituição democrática, merece total respeito, por parte de todos os candidatos que pretendem assumir funções, nos órgãos da entidade para a qual é eleito.
É muito difícil aceitar, sem uma bem fundamentada e convincente argumentação justificativa, o incumprimento da palavra dada, quer oralmente, quer por escrito, designadamente: em comícios, conferências, colóquios; ou inserida nos manifestos eleitorais.
Prometer e/ou enunciar objetivos referentes, por exemplo, a melhoramentos públicos, para o bem-estar das populações, ou dos associados, sem haver um conhecimento mínimo da situação económico-financeira da instituição, ou intervenções que extrapolam as competências do organismo em causa, ou ainda que violam os normativos técnico-jurídicos, pode configurar, logo à partida, o conceito de um carácter megalómano, ou de intenções malformadas, a partir de personalidades e projetos incoerentes.
Igualmente se desenvolvem e evoluem em vários sentidos, tanto as conversas mais abrangentes, como as mais restritas. O diálogo, nestas ocasiões, é idolatrado, as sessões de esclarecimento sucedem-se a um ritmo alucinante, até ao último minuto de um período legalmente fixado. Segue-se, em algumas democracias, um período de reflexão, depois, o dia da eleição e, finalmente, os eleitos a governar; os vencidos na oposição, construtiva, e/ou destrutiva, já pouco importará para alguns dos intervenientes no processo.
Dos debates, do diálogo, da discussão antes havidos, nada mais resta: palavras que, na voz do povo: "leva-as o vento"; promessas que, rapidamente, se esquecem; objetivos que não vão ser atingidos e um novo ciclo se inicia. Habitualmente, recorre-se a várias máximas para se justificarem determinadas situações, embora nem sempre se faça, na prática, o que a máxima aconselha, considerando que: "O mundo enveredou pelo caminho da discussão ou, melhor dito, do diálogo. E está certo. Da discussão nasce a luz e ninguém, de boa-fé e juízo escorreito, pode ou deve minimizar a importância do diálogo. O que não está certo é que nos fiquemos pela discussão sem passar à acção; que gastemos um tempo precioso em colóquios, simpósios, mesas-redondas, etc., etc., com manifesto detrimento da aplicação dos princípios à prática quotidiana. Tantas reuniões e encontros pela sua multiplicidade e repetição podem provocar (e provocam) o enjoo, a saturação e o desânimo." BROCHADO, 1973:70-71).
A credibilização da atividade política, dos políticos profissionais, e/ou amadores (considera-se aqui políticos amadores, os autarcas das freguesias, por exemplo), seguramente que postula comportamentos, educação, formação, experiência, sabedoria e prudência diferentes daqueles que se assistem um pouco em algumas partes do mundo. A realização, desejavelmente, de uma política pedagógica, no sentido da aprendizagem, do esclarecimento, da cooperação, da solidariedade e da tolerância, poderá ser uma das vias para uma maior dignificação desta atividade.
A retidão de carácter, a honra que pela palavra se mostrou nivelar, o sentido de justiça, o conceito de verdade e a noção das limitações pessoais, orgânicas e sistémicas, são aspetos que devem ser apresentados, com humildade e veracidade aos eleitores. Ao eleito é muito mais fácil realizar o que não prometeu, do que passar a mensagem de uma "entidade salvadora" que, depois, quantas vezes faz, precisamente, o contrário.
Em qualquer das situações, é sempre uma questão de ética, porque: "Necessitamos de uma reabilitação do ethos, dos valores morais de base que fundamentam as atitudes humanas; precisamos da ética, de teorias filosóficas ou teleológicas sobre os valores e normas que devem nortear as nossas decisões e comportamentos. A actual crise deve ser entendida como uma oportunidade; importa encontrar uma resposta para os desafios do presente." (KUNG, 1990:55-56).
Qualquer candidato a um cargo, obtido por eleição a partir de um universo eleitoral, legal e legitimamente constituído, deve apresentar-se perante os eleitores com projetos necessários, credíveis e exequíveis para o mandato que, caso seja eleito, vai assumir.
Indiscutivelmente que terá todas as vantagens em divulgar, com verdade e realismo, os objetivos que pretende atingir. É evidente que se prefere uma pessoa com ideias, com projetos, com determinação para lutar, e fazer vencimento das suas causas, dos seus ideais, os quais serão, ou não, vitoriosamente sufragados, pelo eleitorado.
Também parece óbvio que candidatos, reconhecidamente impreparados, egocêntricos, arrogantes e desconhecidos dos eleitores, terão mais dificuldades em vencer, por vezes até com projetos e objetivos interessantes. Conciliar as promessas, os objetivos e a garantia de os concretizar, com as características, capacidades, conhecimentos, experiências e empatia do candidato, poderá ser a parte mais complexa, porém, possível num quadro de referências abonatórias, quanto à idoneidade, veracidade e integridade de um tal candidato.
Importa, portanto: não prometer o que não se tem a certeza de se poder cumprir; apresentar projetos e objetivos exequíveis, num determinado tempo (mandato) e espaço (universo geográfico do eleitorado), que satisfaçam, verdadeiramente, os legítimos interesses e expectativas do eleitorado a quem se dirigem; fundamental usar da máxima lealdade, transparência e rigor para com aqueles que vão decidir sobre a aceitação, ou não, do candidato.
Bibliografia
BROCHADO, Alexandrino, (1973). Sim e Não a Muita Coisa. Porto: Edição do Autor
KUNG, Hans, (1990). Projecto para uma Ética Mundial, Trad. Maria Luísa Cabaços Meliço, Lisboa: Instituto Piaget.